Casarão que pertenceu a Maria Tangará é doado pelo Governo de Minas à Prefeitura de Pitangui

Minas Gerais
Por -09/06/2025, às 14H06junho 9th, 2025
Buraco em muro externo é apenas um dos danos que facilitam invasões (Foto: Reprodução da internet)

Caindo aos pedaços, patrimônio histórico tem custo do restauro estimado em milhões de reais; falta de dinheiro ainda é ime

Com o casarão histórico que pertenceu à lendária Maria Tangará abandonado desde 2019 e quase virando página do ado, o imponente imóvel colonial de três pavimentos construído no final do século 19 em Pitangui e que atualmente sofre ações do tempo e é alvo de vandalismo foi doado pelo Governo de Minas à Prefeitura de Pitangui, que agora tem nas mãos a difícil missão de evitar que ele continue caindo aos pedaços. A reportagem do PORTAL GERAIS apurou que a nova escritura ainda não foi assinada porque o Município ainda aguarda recursos financeiros na casa de milhões de reais que teriam sido prometidos pelo governo estadual.

A deputada estadual Lohanna França (PV) foi uma das responsáveis por alertar o Estado sobre a urgência em adotar alguma medida para preservar o casarão considerado como um dos mais belos e imponentes dos tempos do Brasil colônia de Portugal e tombado em 2008 pelo Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (Iepha-MG). A parlamentar protocolou um requerimento na Assembleia Legislativa de Minas Gerais.

“Nosso mandato entende que preservar o patrimônio histórico de Minas é manter viva a nossa memória e identidade. Como membro da Comissão de Cultura da ALMG, cobramos do Governo de Minas e do Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais, por meio do requerimento 14.537/2025 informações sobre a restauração integral do casarão de Maria Tangará, quando ocorrerão as obras e o cronograma de execução, além de outras informações”, explica Lohanna.

A parlamentar afirma que também mantém contato com a Prefeitura de Pitangui, considerando o fato de que o grau de deterioração do imóvel é preocupante e o começo do trabalho de restauro não pode esperar.

A deputada estadual Lohanna França protocolou requerimento em prol da conservação do casarão (Foto: ALMG/Divulgação)

Sem tempo a perder

O historiador e arquivista do Instituto Histórico de Pitangui (IHP), Israel Almeida, comemora a cessão do imóvel ao Município como primeiro o rumo à manutenção dele. Porém, alerta que não há tempo a perder.

“O casarão ainda se encontra em estado de deterioração, uma vez que se observa danos ainda maiores no assoalho ao longo dos últimos meses. O piso superior também está mais danificado com telhas e forros dos tetos despencando cada vez mais”, detalha.

A cada nova visita que especialistas em patrimônio histórico fazem ao local, novos sinais de invasão são percebidos. Portas abertas, buracos em paredes e nos tetos, janelas quebradas e restos de roupas na parte interna indicam que o local tem sido usado como moradia.

Teto caindo, janelas quebradas e piso destruído: situação atual de uma das salas de aula (Foto: Reprodução da internet)

Por se tratar de um casarão de madeira, um mero descuido por parte de algum invasor no manuseio de fogo para aquecimento pessoal já poderia gerar um incêndio de consequências inimagináveis para o patrimônio histórico local, estadual e nacional.

“A situação mais delicada que se observa é a entrada de civis no prédio. Isso, além de perigoso, não é conveniente, uma vez que a propriedade, embora seja patrimônio público, não está em pleno funcionamento ou condições estruturais adequadas para tal”, observa Israel.

Ao entrarem no prédio, os invasores se colocam em situações que podem ter consequências jurídicas. “Além disso, o cidadão pode estar colocando sua própria segurança em risco, dadas as condições precárias da estrutura”, finaliza.

Israel Almeida espera celeridade na restauração do casarão (Foto: IHP/Divulgação)

Ações da Prefeitura

Logo após a cessão do bem à Prefeitura de Pitangui, a gestão municipal fez uma intervenção para barrar as entradas do casarão com objetivo de evitar arrombamentos, invasões ilegais e ocupações de risco.

A prefeita de Pitangui, Maria Lúcia Cardoso (MDB), disse ao PORTAL GERAIS neste sábado (7/6) que ainda negocia com o governador, Romeu Zema (Novo).

“O nosso líder do Governo, João Magalhães, a pedido meu, foi o autor da Lei que autorizou o governador a doar o casarão para Pitangui”, destaca Maria Lúcia.

Ainda segundo a prefeita de Pitangui, ainda falta a escritura.

“Não assinei a escritura por dois motivos. O primeiro é que o Ministério Público de Minas Gerais move ação contra o Governo do Estado. E o segundo é que eu negocio ainda o valor da restauração. Quero que a Secretaria de Cultura de Minas Gerais me rear o valor”, diz a prefeita.

maria lucia cardoso reeleita prefeita de pitangui
Maria Lúcia Cardoso, prefeita reeleita de Pitangui, acredita que restauro do casarão dará certo (Foto: Divulgação)

Embora a prefeita não confirme o valor, a reportagem do PORTAL GERAIS apurou com fonte próxima ao governo que o Estado teria prometido fornecer R$ 10 milhões para o restauro, mas ainda não fez isso.

Posicionamento do Estado

O PORTAL GERAIS enviou ao Governo de Minas um pedido de detalhamento do contrato firmado com a Prefeitura de Pitangui e valores que teriam sido prometidos para o restauro e aguarda pelo retorno.

Pedaço da história nacional

O sobrado de arquitetura colonial com três pavimentos construído no começo do século 19 em Pitangui que pertenceu à lendária Maria Tangará no período escravagista e abrigou, dentre outras instituições, uma escola estadual entre 1930 e 2019.

Raro registro histórico de um tempo em que o casarão de Maria Tangará ainda não era rodeado por residências modernas; ao fundo, a Matriz de Nossa Senhora do Pilar (Foto: Acervo do blog Daqui de Pitangui)

Em seus tempos de glória o imóvel foi sede do Fórum, do Externato, do Colégio Padre João Porto, assim como da Casa da Intendência de Minas. Em 5 de fevereiro de 1930 foi inaugurada a primeira escola que o prédio abrigou.

Registro de outra fase do imóvel no século 20 (Foto: Acervo do blog Daqui de Pitangui)

Por causa dos perigos que todos esses problemas oferecem, incluindo riscos de acidentes elétricos, em 12 de abril de 2019 houve a transferência das turmas de alunos da Escola Estadual Professor José Valadares para a Escola Estadual Francisca Botelho. Ela fica a um quarteirão de distância.

Fachada do imóvel em 2008, quando o Centro Histórico foi tombado (Foto: Iepha-MG)

Assim, a promessa de um possível restauro do casarão da lendária Maria Tangará manteve as expectativas da comunidade escolar. Mas, o não cumprimento do que havia sido prometido levou à extinção da Escola Estadual Professor José Valadares em 2020.

Pátio onde estudantes brincavam agora está cheio de mato; registro feito em 2023 (Foto: Israel Almeida)

No ano seguinte, um grupo de estudantes que participava de uma oficina de produção de documentários para a “Mostra de Cinema de Pitangui” daquele ano mostrou em detalhes o abandono do casarão. (Assista abaixo)

ados 95 anos desde a aula de estreia, o casarão amarga um abandono que pode o levar a tornar-se apenas uma lembrança – como tantos outros bens históricos que também foram vítimas de descasos institucionais ao longo dos 310 anos de Pitangui.